A chegada do outono e o início do período de tempo seco trazem uma conhecida preocupação: o aumento da incidência de doenças respiratórias, especialmente em crianças.
Somente no Hospital Infantil João Paulo II (HIJPII), da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), os atendimentos a pacientes com doenças respiratórias, que costumam ser próximos de 500 em outras estações, registram entre 1,5 mil a 2 mil atendimentos ao mês no período de clima mais frio e seco, sendo a bronquiolite a principal causa de internação. Até essa quarta-feira (20/3), já foram realizados 1.022 atendimentos com esse perfil.
Segundo a pneumologista pediátrica do HIJPII, Chaline Guimarães Mezêncio, a doença é causada pelo vírus sincicial respiratório, que pode levar, especialmente os bebês, a quadros de tosse, cansaço e falta de ar, com necessidade de uso de oxigênio e, algumas vezes, suporte ventilatório em Unidade de Tratamento Intensivo (UTI).
Além da bronquiolite, gripes, resfriados e pneumonias também são comuns e podem ser ainda piores em crianças pequenas ou portadoras de asma e rinite alérgica.
“A maioria dos casos são resfriados e gripes, que podem levar a sintomas como febre, nariz entupido ou escorrendo, espirros e tosse. As crianças menores de 1 ano – principalmente as com idade abaixo dos seis meses – são as mais afetadas, podendo apresentar quadros mais graves, com muita dificuldade respiratória. Além delas, crianças prematuras, pacientes com síndromes e asmáticos também são mais acometidos e podem apresentar complicações”, afirma a pneumologista.
Causas
A baixa umidade já é um fator conhecido por quem tem filhos, por contribuir para piora dos sintomas em crianças que já apresentam doenças pulmonares como asma ou rinite alérgica.
“O ar seco leva a um maior aprisionamento de partículas de poluição nas camadas mais superficiais do ar. Além de inalar muito mais partículas de poluição neste período, há ainda o ressecamento da própria via aérea que leva a um maior número de sintomas nasais como coceira, espirros, ‘fungueira’ e dificuldade para respirar, podendo também causar broncoespasmos em crianças asmáticas”, explica a médica.
No entanto, a profissional alerta que a baixa umidade não é o único motivo do maior adoecimento das crianças nesta época do ano.
“Outro fator muito importante são os vírus, que tendem a circular mais e encontram facilidade para infectar um número maior de pessoas devido às aglomerações em lugares fechados e ambientes mal ventilados, além de uma mucosa nasal e pulmonar já inflamada pelo efeito da baixa umidade”.
Ainda segundo ela, ingerir alimentos gelados, andar descalço, tomar chuva, sereno, pegar vento, nadar, sair no frio sem agasalho, não passam de mitos para justificar os sintomas respiratórios.
“Tratam-se de infecções respiratórias causadas por vírus e passadas de uma pessoa para a outra e não pelo contato com o frio ou gelado”, esclarece.
Prevenção
Hábitos simples podem ajudar a evitar os principais adoecimentos nesta época do ano. Manter o ambiente bem ventilado, evitar contato com pessoas doentes, locais fechados e com aglomeração de pessoas, além de tomar água com frequência, especialmente nos dias de umidade mais baixa, são alguns deles.
“Crianças que brincam em praças e parques têm menor risco de adoecimento que aquelas que ficam em locais fechados e com muitas pessoas. Além disso, umidificar o ambiente, durante os dias muito secos (em que a umidade esteja abaixo de 30%), com toalhas molhadas ou bacias de água, ajuda bastante. No entanto, é preciso estar atento às crianças pequenas que circulam por esses ambientes para evitar acidentes”, orienta a pneumologista.
Outra medida muito importante de prevenção é fazer a lavagem nasal das crianças com soro fisiológico, umidificando e limpando a mucosa de partículas (poeiras, poluentes, alérgenos), reduzindo o excesso de muco e também facilitando a absorção de medicamentos nasais quando necessários.
“Em crianças menores de seis meses, indicamos usar um volume menor de soro fisiológico 0,9%. Para isso, tente colocá-la sentada no colo, com o tronco e a cabeça um pouco inclinados para frente, e aplique o soro com seringa de 1ml ou quatro jatos únicos do produto em cada narina. No caso de crianças maiores de seis meses, podem ser usadas seringas de 5ml a 10ml ou spray de jato contínuo, em cada narina, até que ela sinta mais conforto na hora de respirar. Neste caso, a criança deve estar na mesma posição das mais novas, porém orientamos, ao lavar a narina direita, inclinar a cabeça dela levemente para a esquerda, e, ao lavar narina esquerda, inclinar a cabeça para a direita”, explica a médica.
Ela ressalta ainda a importância de manter uma alimentação saudável e o cartão de vacinas em dia.
“Crianças bem nutridas são mais resistentes aos vírus que causam as doenças. Além disso, é extremamente importante manter as vacinas em dia, incluindo a vacina anual da influenza e a vacina da covid-19, que protegem contra vírus que podem causar internações e casos graves de doenças respiratórias”, alerta.
Uso correto da bombinha
O uso da “bombinha” – dispositivo que libera medicamentos inalatórios – é muito comum em crianças para tratar crises de asma e chieira durante gripes e resfriados.
Porém, é preciso estar atento à forma correta de aplicação do medicamento, que deve ser usado somente com prescrição de um médico.
“Em crianças, deve-se sempre usar o espaçador com duas ou três válvulas. Nunca usar a bombinha diretamente na boca. Para uma aplicação adequada da medicação e melhor aproveitamento do remédio, o cuidador deve posicionar a criança sentada, com o tronco firme e ereto, colocar a máscara do espaçador de forma que vede completamente a boca e o nariz, agitar a bombinha (a latinha juntamente com o cano) por alguns segundos, encaixar a bombinha no espaçador, aplicar um jato, aguardar dez segundos com a criança respirando normalmente dentro da máscara – de preferência com a boca aberta – , e repetir o passo a passo antes de cada jato, conforme orientação médica. Já as crianças maiores de 7 anos podem ser treinadas pelo médico ou pela enfermeira a usarem o bocal do espaçador ao invés da máscara”, explica Chaline.
Quando levar ao hospital?
É importante estar atento aos sintomas para não levar a criança a um hospital ou centro de saúde sem que haja necessidade, evitando que ela seja exposta ao contato com outras crianças doentes e causando uma grande aglomeração de pacientes na espera por um atendimento médico – já que este ano os centros de saúde se encontram com alto número de pacientes devido à pior epidemia de dengue da história de Minas Gerais.
“Crianças com febre persistente, por mais de três ou quatro dias, sem nenhum sinal de melhora, prostração mesmo nos momentos em que não está febril, crianças muito irritadas sem causa aparente, cansaço e dificuldade para respirar – que pode ser notado pela respiração muito rápida, com esforço (a barriga afunda e volta, as costelas ficam aparentes, o pescoço afunda e o nariz mexe como se precisasse puxar mais ar) – ou bebês que apresentam gemido ao respirar, necessitam de atenção e uma avaliação médica imediata”, explica a pneumologista.
Ela aproveita para fazer um alerta sobre o uso da medicação sem orientação médica, mesmo quando se trata de vitaminas.
“Qualquer medicação só deve ser usada com prescrição de um médico, principalmente quando falamos sobre crianças. É importante saber que não existe vitamina ou remédio milagroso para evitar as infecções respiratórias e melhorar a imunidade, nem remédios e xaropes que melhorem os sintomas das gripes e resfriados imediatamente. Em geral, nosso corpo tem a capacidade de controlar as infecções e combatê-las, desde que encontre um corpo saudável, bem nutrido, hidratado e feliz”, conclui.
Sobre o hospital
O HIJPII possui mais de 40 anos de atuação e é o único hospital pediátrico totalmente público do estado. A unidade possui 129 leitos de enfermaria e 16 de terapia intensiva e também abriu, em 26/2, uma unidade de hidratação com 20 poltronas para atendimento de crianças, com até 12 anos, com suspeita de dengue, chikungunya e zika.
Além disso, até abril serão abertos dez novos leitos de UTI Pediátrica, que funcionarão no Hospital João XXIII, para servir de apoio à demanda de internação do HIJPII neste período de outono e inverno.
Além do Hospital João Paulo II, há outros locais com atendimento infantil na capital, como o Hospital Odilon Behrens e UPAs da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, com funcionamento, inclusive, aos fins de semana.